quinta-feira, 23 de fevereiro de 2006

Quando meu filho precisa de um pai

Quando meu filho precisa de um pai

Ontem fiquei sabendo da morte do filho de um conhecido meu, moleque de pouco mais de 18 anos, morto em acidente de trânsito. Confesso que a sensação foi algo como: "ufa, essa passou perto!"

Se você também é pai concorda comigo. Morte de filho, nem pensar! Antes eu do que ele. Câncer, acidentes, drogas, qualquer outra desgraça moderna? Sai fora!

Hoje peguei um trecho de estrada e me apliquei a pensar nisso. E cheguei a triste conclusão que tenho sido um pai mais preparado para os momentos em que meu filho não precisa de mim. Para os momentos em que ele mais precisa, parece que pulo fora.

Não há pai que se negue a chorar a morte de um filho, e deve doer muito. Se ele foi um pai "daqueles", fica a dor. Mas se ele foi um pai "da-que-les", além da dor ficam os ressentimentos. E nessa hora é tarde...

Não há pai que queira seu filho metido em drogas ou álcool. Mas por que tantos pais só se mexem depois que a desgraça acontece?

Não há pai que não queira que sua filha case feliz, com o cara certo, e que lhe dê netos na hora certa, sem crises. Mas por que tanta gente não sabe se chora pela filha ou festeja pelo neto que entra em cena antes das alianças?

Não há pai que sequer admita dúvidas quanto ao amor que tem pelo filho. Mas por que tantos pais vivem guardando esse amor só para quando é tarde demais?

Onde estava o pai quando a filha (e mais alguém) arrumaram um neto pra ele? Onde deveria estar esse pai? Por certo não seria dentro do motel, mas muito antes da filha ir pra lá com alguém o pai por certo esteve ausente em alguma cena, em alguma passagem.

Onde estava o pai quando o filho resolveu experimentar um fuminho "daqueles"? Ou quando resolveu tomar um porre? Por certo não seria na rodinha de fumo, nem na mesa de um bar. O pai fez falta em algum momento antes. Ou sua presença foi inoportuna em alguma hora, dando algum mau exemplo.

A hora certa de um pai se fazer presente chega muito antes das desgraças. É quando se pode moldar o caráter do filho (ou da filha), é quando ele ainda é um satélite dos pais. Como Deus diz, pela pena de Salomão: ensina a criança (enquanto é criança) no caminho em que deve andar, e quando crescer (no gradativo processo de deixar de ser criança) jamais se desviará dele. Curioso é que Salomão deve ter aprendido essa lição mais pelo sofrimento do que pelo acerto. É certo que ele teve muitos e muitos filhos, e embora não saibamos muito de seu desempenho como pai, podemos antever que não deve ter sido grande coisa, pelo relato do comportamento de seu filho Roboão, seu filho e sucessor no trono.

E quando meu filho precisa de mim?

A primeira conclusão a que chego é: nem sempre meu filho precisa de mim quando ele pede minha presença ou me valoriza.

Como assim?

Durante o curto tempo em que você é o herói do seu filho (ah, bons tempos... adolescência é dose...), seu filho pode até gostar de dizer que o pai é um empresário de sucesso, que tem um carro assim ou assado. Mas isso dura pouco. É tão passageiro quanto os tênis que ele usa nos pés ? novos hoje, amanhã estraçalhados. É óbvio que tudo isso dá segurança, esteio, mas o que fica mesmo é quem você é para ele, não o que você tem. Do mesmo jeito que nós descontamos nossas frustrações comprando coisas para mostrar aos vizinhos, eles podem estar se gabando das coisas que o pai tem e lhes dá, como uma espécie de compensação pela falta de um pai que também lhes supra o que dinheiro não compra.

Outra coisa é quando seu filho quer brincar com você, jogar com você. Esta é uma das maiores armadilhas. Quantas e quantas vezes eu fui, brinquei, joguei (o que é certo e necessário). Mas a medida em que a minha língua alcançava o meu pé (inevitavelmente muito antes de meu filho esboçar qualquer sinal de cansaço), eu me dava por satisfeito com aquela "amostra". Encerrava a sessão de lazer, cortava a conversa e dizia: "tenho que trabalhar". E se houvesse muita insistência, ai dele...

O que fica depois de terminada a cena? Qualquer filho esquece o que o pai tinha e o que o pai fazia. Mas lembra-se por toda a vida de como o pai fazia, de quem o pai era, de como ele o tratava, de com que cara ele fazia as coisas. Igualzinho a você, lembra?

Quando seu filho pede sua presença ele quer brincar, é óbvio, como qualquer criança. Mas o que ele vai guardar não é o resultado da brincadeira. Ele vai guardar pra sempre quem você é. E o que você é faz a cabeça dele. E como.

E isso me leva a segunda conclusão: meu filho jamais vai me pedir muitas das coisas que ele realmente precisa.

Eu me explico.

Alguma vez um filho pediu limites a seu pai? Olha, pai, estou saindo com a galera... a que horas tenho que voltar? Ou então sua filha: olha pai, tem um carinha que quer namorar comigo. Que você acha? Você jamais vai ouvir algo assim. Mas vai ter que agir sempre.

Esqueça de esperar pela iniciativa de seu filho em lhe perguntar certas coisas, ou lhe pedir ajuda em outras. Por duas razões muito fortes:

1) ele não tem a mínima idéia do que precisa. Ainda não tem experiência acumulada. E vai acabar decidindo na hora. Bater na bola do jeito que ela chega;

2) pais e mães são de outro planeta quando ele passa de uma certa idade. "Como é que meu pai pode gostar daquelas músicas, cara, fala sério!" (ou traduzindo na língua dos chats e bloggers deles: "Cum é q mo pa po gosta daklas muzk... kra... fla seryu!"). Os pais falam e escrevem em português, já os amigos o fazem no idioma dele (ultimamente isso tem tomado dimensões maiores). Muito mais fácil deles se falarem.

Enfim, seu filho não pede, mas precisa. Não quer, mas precisa. Vai espernear, mas precisa. Ele precisa de limites, de um pai que diga sim e diga não. De um pai que o encaminhe no trilho que ele nem sequer sabe para que serve. De um pai que se meta na vida deles na medida do necessário, nem mais, nem menos.

E você e eu, pais que não sabem nem como, nem quando? Nós precisamos do pai eterno, o pai da luzes. Precisamos aprender de Deus o caminho a ensinar ao filho, para que ele jamais se desvie dele.

Uma coisa é certa. De uma hora para outra nossos filhos começam, querem e precisam tomar decisões sozinhos. Nessas horas, melhor que saibam qual o caminho que devem seguir. Se for o caminho certo, Deus diz que jamais se desviarão dele. Se for o errado... danou-se. E você, definitivamente, não estará na cena.

E tem aquela piada que fala que Deus, após ter expulsado Adão e Eva do paraíso, disse a algum anjo que fazia cara de "e agora, chefe?": "Calma, eles terão filhos!"

Carlos Sider

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