sexta-feira, 28 de janeiro de 2005

Tudo no seu devido lugar...

O prefeito recém empossado do município de Ponte Nova, em Minas Gerais, é espírita. Mal ocupou o lugar à frente da administração municipal, tomou uma decisão polêmica: mandou que fossem retiradas das repartições públicas todas as imagens e símbolos religiosos. A atitude custou-lhe uma grande polêmica. A ordem foi cumprida, mas não sem protestos. Muita gente acusou o prefeito de estar atentando contra a liberdade de expressão religiosa.

O prefeito, por sua vez, alegou que não é justo que os bens públicos, as repartições e espaços administrados pelo município ostentem apenas um credo, ou seja, o católico, ou cristão, ou espírita, o que for. Numa visão mais imediatista, talvez achemos que ele tenha sido cerceador de direitos. Mas se a gente parar pra analisar, a autoridade máxima de Ponte Nova está coberta de razão.

Muito simples. Quando dizemos que o Estado Brasileiro é laico, estamos dizendo que não importa qual seja a religião ou credo, ou ausência de um ou de outro, de nossos governantes, esta não deve interferir na condução da administração de cidades, estados e do próprio País. Não devem sequer interferir na elaboração das leis, lembramos. Entendemos, portanto, que quando uma repartição pública, seja ela federal, estadual ou municipal, ostenta oficialmente um símbolo religioso, involuntariamente, oficializa tal credo, quando não deveria faze-lo. Tal atitude, por mais corriqueira, inofensiva e bem intencionada que pareça, produz constrangimento a quem pensa diferente. E subentende-se, da mesma forma, que estes espaços públicos poderiam, e deveriam, ser ocupados por símbolos e imagens de todas as religiões, e não por uma específica. É compreensível a ação do novo prefeito de Ponte Nova. Afinal, quem paga impostos é a população que, por sua vez, é formada por gente de todas as raças, credos, visões e seja lá mais o quê.

No finalzinho de 2003, o Governo Francês comprou uma briga com a população muçulmana quando resolveu proibir a utilização de símbolos religiosos e dos famosos véus – hábito das mulheres islâmicas – nas escolas públicas. A intenção era democratizar o sentimento religioso de cada pessoa, derrubando as barreiras impostas pela exposição das imagens, hábitos e símbolos. Não foi fácil. Mal interpretada, a decisão foi comparada uma restrição ao direito de expressar a fé. Bem parecido com o que ocorre em Minas Gerais.

Por aqui já houve político querendo criar feriados evangélicos. A desculpa são os inúmeros feriados católicos existentes no Brasil. É verdade. São injustos, afinal o Catolicismo não é a religião oficial do Governo Brasileiro que, como já dissemos, não tem religião, é laico. Mas será que a solução seria nos equiparar-nos, reivindicando feriados para nosso credo? Não há nada mais original em que se pensar? Que tal se não parássemos? Todo mundo reclama, mas é beneficiado pelos tais feriados. Sinceramente, não estou muito preocupada com a criação de feriados evangélicos. Para mim eles são desnecessários. O problema é que tem muito evangélico aí querendo repetir velhas fórmulas, fazer o que todo mundo faz quando tem poder, ao invés de fazer diferente. Tem gente aí que, se chegar ao poder um dia, é capaz de instituir uma verdadeira "ditadura evangélica" impondo valores, hábitos, pontos de vista. Gente que ainda não aprendeu e sequer sabe mesmo o que é democracia.

O exercício religioso é individual. Precisa ser estampado, propagado, mas de maneira sábia, coerente, respeitosa. O que é público, público é e, portanto, ostenta cores, sabores, cheiros, sentimentos diversos. Quem administra precisa ter isso em mente. A Constituição garante a liberdade de culto. Proibir a exposição de imagens e símbolos religiosos em espaços públicos, ao meu ver, não é restringir essa liberdade, mas garanti-la no espaço devido, evitando-se o constrangimento de pensamentos diferentes. Afinal, as pessoas devem escolher freqüentar este ou aquele culto, crer nisto ou naquilo. Mas num ambiente cujo objetivo é servir, receber, atender a todos, as visões políticas, religiosas e tantas outras devem ceder lugar ao consenso. Ponto para o prefeito.

Márcia Rodrigues é jornalista, especialista em Ciência Política pela Universidade Católica de Pernambuco.

http://www.folhagospel.com/

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